O Mito de Atlântida em Platão – Parte 1

Platão e Atlantida

O MITO DE ATLÂNTIDA EM PLATÃO (PARTE 1):
Qual a localização da ilha mítica?

Nesta conhecida passagem dos diálogos platônicos, o autor relata uma curiosa história que o ateniense Sólon ouviu no Egito: a do mito da Atlântida. A lenda foi preservada por pastores egípcios desde o ano 400 a.C. Ela descreve dois diálogos que se referem a uma viagem de Sólon ao Egito, onde ele soube que os sacerdotes egípcios de Sais possuíam registros escritos sobre “uma ilha continental além das Colunas de Hércules chamada Atlântida, o centro de um grande e maravilhoso império” com uma grande população, cidades de telhados de ouro, frota e exércitos poderosos para invasão e conquistas. A Atlântida é descrita como uma civilização avançada, um império de engenheiros e cientistas, tão ou mais avançados tecnologicamente que a nossa civilização.  Veja como aparece no Timeu:

TEXTO ORIGINAL EM GREGO:

[21e]  “ἔστιν τις κατ᾽ Αἴγυπτον,” ἦ δ᾽ ὅς, “ἐν τῷ Δέλτα, περὶ ὃν κατὰ κορυφὴν σχίζεται τὸ τοῦ Νείλου ῥεῦμα Σαϊτικὸς ἐπικαλούμενος νομός, τούτου δὲ τοῦ νομοῦ μεγίστη πόλις Σάις — ὅθεν δὴ καὶ Ἄμασις ἦν ὁ βασιλεύς (…). οἷ δὴ Σόλων ἔφη πορευθεὶς σφόδρα τε γενέσθαι παρ ᾽ αὐτοῖς ἔντιμος, [22a] καὶ δὴ καὶ τὰ παλαιὰ ἀνερωτῶν ποτε τοὺς μάλιστα περὶ ταῦτα τῶν ἱερέων ἐμπείρους, σχεδὸν οὔτε αὑτὸν οὔτε ἄλλον Ἕλληνα οὐδένα οὐδὲν ὡς ἔπος εἰπεῖν εἰδότα περὶ τῶν τοιούτων ἀνευρεῖν. καί ποτε προαγαγεῖν βουληθεὶς αὐτοὺς περὶ τῶν ἀρχαίων εἰς λόγους, τῶν τῇδε τὰ ἀρχαιότατα λέγειν ἐπιχειρεῖν, περὶ Φορωνέως τε τοῦ πρώτου λεχθέντος καὶ Νιόβης, καὶ μετὰ τὸν κατακλυσμὸν αὖ περὶ Δευκαλίωνος [22b]καὶ Πύρρας ὡς διεγένοντο μυθολογεῖν, καὶ τοὺς ἐξ αὐτῶν γενεαλογεῖν, (…) [23d] τὸν οὖν ἱερέα φάναι: ‘φθόνος οὐδείς, ὦ Σόλων, ἀλλὰ σοῦ τε ἕνεκα ἐρῶ καὶ τῆς πόλεως ὑμῶν, μάλιστα δὲ τῆς θεοῦ χάριν, ἣ τήν τε ὑμετέραν καὶ τήνδε ἔλαχεν καὶ ἔθρεψεν καὶ ἐπαίδευσεν, προτέραν μὲν τὴν παρ᾽ [23e] ὑμῖν ἔτεσιν χιλίοις, ἐκ Γῆς τε καὶ Ἡφαίστου τὸ σπέρμα παραλαβοῦσα ὑμῶν, τήνδε δὲ ὑστέραν. τῆς δὲ ἐνθάδε διακοσμήσεως παρ᾽ ἡμῖν ἐν τοῖς ἱεροῖς γράμμασιν ὀκτακισχιλίων ἐτῶν ἀριθμὸς γέγραπται. (…) [24e] (…) λέγει γὰρ τὰ γεγραμμένα ὅσην ἡ πόλις ὑμῶν ἔπαυσέν ποτε δύναμιν ὕβρει πορευομένην ἅμα ἐπὶ πᾶσαν Εὐρώπην καὶ Ἀσίαν, ἔξωθεν ὁρμηθεῖσαν ἐκ τοῦ Ἀτλαντικοῦ πελάγους. τότε γὰρ πορεύσιμον ἦν τὸ ἐκεῖ πέλαγος: νῆσον γὰρ πρὸ τοῦ στόματος εἶχεν ὃ καλεῖτε, ὥς φατε, ὑμεῖς Ἡρακλέους στήλας, ἡ δὲ νῆσος ἅμα Λιβύης ἦν καὶ Ἀσίας μείζων, (…)  [25a] ἐν δὲ δὴ τῇ Ἀτλαντίδι νήσῳ ταύτῃ μεγάλη συνέστη καὶ θαυμαστὴ δύναμις βασιλέων, κρατοῦσα μὲν ἁπάσης τῆς νήσου, πολλῶν δὲ ἄλλων νήσων καὶ μερῶν τῆς ἠπείρου: (…) [25b] αὕτη δὴ πᾶσα συναθροισθεῖσα εἰς ἓν ἡ δύναμις τόν τε παρ᾽ ὑμῖν καὶ τὸν παρ᾽ ἡμῖν καὶ τὸν ἐντὸς τοῦ στόματος πάντα τόπον μιᾷ ποτὲ ἐπεχείρησεν ὁρμῇ δουλοῦσθαι. (…) [25c] (…) ὑστέρῳ δὲ χρόνῳ σεισμῶν ἐξαισίων καὶ κατακλυσμῶν γενομένων, μιᾶς [25d]ἡμέρας καὶ νυκτὸς χαλεπῆς ἐπελθούσης, τό τε παρ᾽ ὑμῖν μάχιμον πᾶν ἁθρόον ἔδυ κατὰ γῆς, ἥ τε Ἀτλαντὶς νῆσος ὡσαύτως κατὰ τῆς θαλάττης δῦσα ἠφανίσθη: ” (…)

J. Burnet, Plato. Timaeus, in _______, Platonis Opera, v. 3, Oxford, Oxford University Press, 1903.


Mapa de Atlântida

Athanasius Kircher’s Map of Atlantis (c.1669)

TRADUÇÃO

Há no Egipto – começou Crítias –, no extremo inferior do Delta, em redor da zona onde se divide a corrente do Nilo, uma região chamada Saiticos; e da maior cidade dessa região, Sais – precisamente de onde era natural o rei Amásis – (…)

Dizia Sólon que, enquanto por ali andou, era [22a] muitíssimo respeitado por eles, e que, a certa altura, ao questionar os sacerdotes mais versados sobre acontecimentos antigos, descobriu que nem ele nem nenhum outro grego sabia, por assim dizer, quase nada sobre aquele assunto. Como ele pretendia induzir os anciãos a conversarem sobre acontecimentos antigos, pôs-se a contar as tradições ancestrais que há entre nós. Falou de Foroneu, que se diz ter sido o primeiro homem, e de Níobe, de como Deucalião e Pirra sobreviveram ao dilúvio, e discorreu sobre a genealogia dos que lhes sucederam. (…)

[23d] Então, o sacerdote respondeu o seguinte: “É sem reserva alguma que to contarei, ó Sólon, por consideração a ti e à vossa cidade e, acima de tudo, por gratidão à deusa, a quem coube em sorte a vossa cidade e também esta, que ela criou e educou – primeiro a vossa, mil anos antes [23e] da nossa, depois de ter recebido de Gaia e de Hefesto a semente de onde vós nascestes, e depois esta aqui. Segundo os números gravados nos escritos sagrados, a nossa cidade foi organizada há oito mil anos. (…) [24e] Os nossos escritos referem como a vossa cidade um dia extinguiu uma potência que marchava insolente em toda a Europa e na Ásia, depois de ter partido do Oceano Atlântico. Em tempos, este mar podia ser atravessado, pois havia uma ilha junto ao estreito a que vós chamais Colunas de Héracles – como vós dizeis; ilha essa que era maior do que a Líbia e a Ásia juntas. (…) [25a] Nesta ilha, a Atlântida, havia uma enorme confederação de reis com uma autoridade admirável que dominava toda a ilha, bem como várias outras ilhas e algumas partes do continente. (…) [25b] Esta potência tentou, toda unida, escravizar com uma só ofensiva toda a vossa região, a nossa e também todos os locais aquém do estreito. (…) [25c] Posteriormente, por causa de um sismo incomensurável e de um dilúvio que sobreveio num só dia e numa noite [25d] terríveis, toda a vossa classe guerreira foi de uma só vez engolida pela terra, e a ilha da Atlântida desapareceu da mesma maneira, afundada no mar.”


NOTAS
(palavras em negrito na tradução)

  1. A cidade de Saís (gr. Σάϊς), atualmente Sah el-Haggar, ficava na parte oeste do delta do Nilo e era a capital do 5º nomo (província) do Antigo Egito. Lá reinaram os faraós da 24ª Dinastia (c. -732/-720) e da 26ª Dinastia (-664/-525).
  2. Amásis II (gr. Ἄμασις), faraó egípcio da 26ª Dinastia, reinou de -570 a -526, durante o Período Saíta, pouco antes da conquista persa. É improvável que tenha conhecido o ateniense Sólon, cujo arcontado data de -594/-593, a despeito das afirmações de Heródoto (1.29-30)
  3. Essa Níobe é uma das filhas de Foroneu, homem primevo e um dos heróis fundadores da Argólida. Não deve ser confundida com Níobe, filha de Tântalo, objeto da vingança de Ártemis e de Apolo.
  4. A deusa grega Atena, segundo Heródoto (2.59) e Platão (21e), era a mesma deusa egípcia Neith (antigo egípcio Nj.t = Net / Neit), protetora de Saís, cidade situada na parte oeste do delta do Rio Nilo. É a mais antiga deusa atestada nos textos egípcios e seu culto remonta à 1ª Dinastia (c. -3100/-2886).
  5. Colunas de Héracles (gr. Ἡράκλειοι Στῆλαι, lat. Columnae Herculis): nome do Estreito de Gibraltar na Antiguidade. Ele tem atualmente apenas 13 km de extensão, fica no extremo ocidental do Mediterrâneo e separa dois promontórios, um no sul da Europa (o rochedo de Gibraltar) e outro no norte da África (rochedo de Ceuta). Do outro lado está o Oceano Atlântico
  6. A Líbia (gr. Λιβύη) compreendia, no Período Arcaico e na época de Heródoto, as terras do norte da África que ficavam a oeste do Vale do Nilo, onde viviam os líbios, e no extremo sul do Egito, onde viviam os etíopes. O denominação “África” data de -146 e foi dada pelos romanos.

Fonte:  RIBEIRO JR., W.A. Platão / Timeu 21e-25d. Portal Graecia Antiqua, São Carlos. URL: greciantiga.org/arquivo.asp?num=0396. Consulta: 22/01/2017.


PARA BAIXAR O DIÁLOGO COMPLETO:

download-pdfTIMEU – Tradução de Rodolfo Lopes.

Um comentário sobre “O Mito de Atlântida em Platão – Parte 1

Deixe um comentário